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Conferência de Evian

Registro RG-ARQ/308
Classificação Reservado
Tipologia Oficio
Data 1938-07-18
Cidade Genebra
Estado Genebra
País Suíça
Código 2
No. Doc. 101.34
Páginas 15
Idioma Português

Instituição de origem

De: Hélio Lobo
Cargo:
Instituição: Consulado Geral do Brasil em Genebra

Instituição de destino

Para: Oswaldo Aranha
Cargo: Ministro das Relações Exteriores
Instituição:

1. Helio Lobo, Cônsul Geral do Brasil em Genebra informa a Oswaldo Aranha, Ministro das Relações Exteriores, os acontecimentos durante a realização da Conferência de Evian. "Antes de partir de Paris, tive a honra de enviar a Vossa Excelência, pela via aerea, meu oficio nº 1, de 30 de junho. Por inadvertencia, deixou de levar a nota de reservado, o que ficou constando do texto definitivo que com este segue, pela via comum". [p.1]

3. Ao chegar em Paris Helio Lobo procurou alguma informação sobre a Conferência de Evian com o Embaixador Myron C. Taylor, que colaborou com todas as informações solicitadas.

4. "Solicitou-me o Embaixador toda a colaboração possivel". [p.2]

5. "Impressionou-me desde logo a sinceridade do delegado norte-americano, sua nobreza de propositos, a tenacidade com que ia pôr-se ao serviço da causa, que lhe confiára Franklin D. Roosevelt. Com sua Excelência estavam seus dois assessores técnicos, Robert T. Pell e Jorge L. Brandt, altos funcionarios do Departamento de Estado, os quaes, com o primeiro assessor James G. McDonald, conselheiro do Presidente Roosevelt para os refugiados politicos, o antigo Alto Comissario da Sociedade das Nações, lhe seriam companheiros inseparaveis". [p.2]

6. Também representava a delegação brasileira Jorge Olinto de Oliveira, primeiro secretário de Legação. [p.2]

7. "Trinta e duas nações estavam presentes na cidade franceza, á margem do Lago Léman, para convocação norte-americana. Toda a America, menos Salvador. Da Europa, França, Grã Bretanha, Irlanda, Paizes Baixos, Suiça, Belgica, Dinamarca, Suecia, Noruega (...) Australia, Canadá, Nova Zelandia. Ausentes, a Italia, por motivos que dispensa esclarecer, á vista de seu entendimento com a Alemanha; e a Polonia, apesar do seu grande interesse nos problemas imigratorios". [p.3]

8. Quanto ao chefes das delegações, Helio Lobo menciona: França, Henry Béranger, Presidente da Comissão de Relações Exteriores; Grã - Bretanha, Lord Wintherton, Membro do Parlamento e Chanceler do Ducado de Lancaster; Delegação latino americana, Thomas A. Le Breton, Embaixador em Londres e F. Garcia Calderón, Ministro do Peru na França. Seguira em correio ordinário a lista completa dos delegados, "bem como os documentos distribuidos pela Secretaria eral durantes os trabalhos". [p.3]

10. Programa aceito pelos países membros da comissão: [p.4]

  1. "escoamento dos refugiados da Alemanha e Austria compreendidos como taes os que já deixaram e os que ainda desejavam deixar o país, para essa obra se levaria em conta a contribuição das instituições internacionais existentes.
  2. apresentação dos meios, segundo a legislação interna de cada um, para a realização desse proposito, sendo desejavel que cada país expuzesse a legislação imigratoria respe[c]tiva, não só numericamente mas tambem sob os demais aspe[c]tos; oferecendo quaesquer comunicações confidenciais para uso estrito da comissão;
  3. exame da questão dos documentos de identidade para os imigrantes que não os tivessem.
  4. creação de uma comissão permanente, numa capital europeia, comissão encarregada de formular e pôr em execução, sempre em colaboração com as referidas instituições internacionais, um plano de largo raio, para a saída metodica dos refugiados da Alemanha e Austria e, mais tarde, de outros paises.
  5. resolução recomendando as deliberações tomadas, bem como quaesquer outras que pudessem ser objeto de exame". [p.4]

11. "Estava expresso, pois, que os emigrados, objeto de deliberação, seriam os de Alemanha e Áustria, primeiramente; que as instituições internacionais, existentes em tal materia, colaborariam na tarefa, a qual seria levada a efeito por uma comissão oficial permanente; e que, devendo realizar-se a emigração dentro do regime legal de cada país, estava excluida a hipotese da movimentação em massa, como a dos armenios e gregos após a guerra mundial. Filtrar-se-ia, assim atravez da mesma comissão permanente, o elemento imigratorio que cada um pudesse receber". [p.4]

12. "Nas instruções, com que, em data de 22 de Junho passado, me honrou Vossa Excelência encarregou-me essa Secretaria de Estado de ter sempre em vista a circular secreta nº. 1.127, que veda o visto nos passaportes israelitas; chamando tambem minha atenção para a proibição de entrada para os apatridas. Não havia inconveniente, escreveu ainda Vossa Excelência, em que eu apoiasse as propostas relativas á creação da comissão permanente e aos documentos suplementares de identidade. Na aparencia havia antagonismo entra a convocação da Conferencia e as instruções, pois que aquela trataria de imigração na sua maioria israelita, a qual em grande parte, não tem documentos de identidade". [p.5]

13. Quanto a imigração "(...) já em Evian, ao delegado norte-americano, as condições em que nos ajustavamos aos seus desiígnios, - tarefa tanto menos ardua quanto ha excelentes elementos israelitas e cerca de dez mil catolicos alemães e austriacos a colocar". [p.5]

14. "Nesse espírito comecei a trabalhar. A Argentina tinha o mesmo ponto de vista, que o Brasil, isto é, aceitar em principio para decidir de facto depois. [p.5] A Colômbia só não concordava com a deliberação sobre os alemães e austriacos que ainda não deixaram o Reich, pois se dizia ciosa de intervir na soberania alheia, questão tambem suscitada, com menos rigidez pela Venezuela. (...) O Uruguay como outros, objetava á creação de uma secretaria especial, pelas despezas que ia acarretar. E o Chile fazia reservas quanto á sua participação na comissão (...)". [p.6]

15. Sobre a participação brasileira na Comissão Helio Lobo diz que "podiamos assim conciliar o lado humanitario com as nossas conveniencias imigratorias. Pelo intermedio da obra de refugiados da Sociedade das Nações, como me indicaram essas instruções, é que não seria possivel". [p.6]

17. A Conferência de Evian foi organizada em duas sub- comissões, sendo a primeira encarregada de ouvir os representantes de associações de amparo aos israelitas e outros; a segunda comissão ficou encarregada de receber a política de legislação imigratória de cada um e foi presidida pelo Delegado da Austrália. "Foram ouvidas pela sub-comissão 24 personalidades, representando 39 associações. Regist[r]ando-o, o relatorio aprovado aludido a uma "imensa tragedia humana" que está a pedir remedio urgente". [p.7]

18. O apelo dos italianos banidos e a expectativa da ameaça de expulsão de milhões de judeus da Polônia e Romênia não abalou a realização da Conferência de Evian, todos os acontecimentos preservaram o foco central da reunião. Helio Lobo alerta a Secretaria de Estado para algumas associações israelitas ou não:

  • "amparo aos catolicos, representada na Conferencia pelo Franciscano Odo von Wurtemberg, de antiga nobreza alemã";
  • a comissão de defesa dos israelitas da Europa Central e Oriental;
  • a associação de colonização judaica - colônia de Rezende - comissão de médicos austríacos, sob direção de Neumann de Vienna;
  • "união das sociedades para o preparo do trabalho industrial e agricola entre os judeus". [p.8]

19. Na segunda sub-comissão técnica, cada país expôs seu caso. O Brasil se posiciona: "De um modo geral, predominou a reserva, embora com declarações de solidariedade humana e apoio a iniciativa norte - americana". "Perante a segunda sub-comissão, também chamada de técnica, apresentou casa país a exposição de seu caso. Dela fez parte o Brasil. De um modo geral, predominou a reserva, embora com declarações de solidariede humana e apoio á iniciativa norte-americana. Dividiram-se, a este respeito, as nações em dois grupos, as de refugio, visinha da Alemanha e Austria, com poder de absorpção e encargos de asilo quasi exgotados; e os de imigração, mais distantes, com [p.8] alguma probabilidade de escoamento". Da conferência ficou consignado que os países de trânsito iriam "prestar-se á readaptação industrial e agricola do imigrante", segundo Helio Lobo essa era uma das preocupações da Conferência. [p.9]

20. "Quanto aos paises chamados de imigração, dois foram ainda os grupos: A Palestina e os paises de além-mar. Naquela, segundo declaração do delegado britânico, não podem por ora ampliar-se as quotas judias, pela hostilidade dos arabes". "Quanto aos paises de além-mar, a reserva foi geral. A America Latina não deseja imigrantes senão rurais, receiosa da perturbação que a admissão, de israelitas urbanos, possa trazer ás suas condições etnicas, sociais e mesmo políticas, sentimento que foi também o do Brasil". Sobre a Austrália e as "colônias britânicas" nenhuma posição foi tomada. [p.9] "E os Estados Unidos da America declararam que haviam reunido as quotas de alemães e austriacos em uma só, o que permitia a entrada de 27.370 anualmente". [p.10]

21. "Outra preocupação norte-americana foi de não melindrar o Reich, do qual depende, sobretudo quanto á permissão de saída de dinheiro, a solução da questão". [p.10]

22. Helio Lobo informa a falta de atenção e de autonomia dada aos latinos americanos, principalmente na composição das subcomissões e presidências destas. Apesar disso, ele reitera que essa situação "se sanou" e que cooperação e o acolhimento entre os países participantes existiu. Menciona um texto elaborado pelo Embaixador norte americano para a Conferencia, e que foi aprovado. "No texto vencedor, por sugestão da América Central, da Colômbia e da Venezuela, eliminou-se um ou outra expressão, com "perseguições a que estão sujeitos", de acordo com o desejo anteriormente manifestado de não melindrar o Reich". [p.11]

23. "Variaram muito os organismo sobre a gente já emigrada e ainda por emigrar. Mas podem contar-se em 300.000, dos quais 100.000 austriacos, judeus puros. O não ariano, como Vossa Excelência sabe, é aquele que não tem ascendencia pura, desde 1800 pelo menos. Por absurda ou convencional que seja essa noção distribuição de raças, é a que existe oficialmente no Reich". Relata a participação das associações judaicas na Conferência. [p.12]

24. Helio Lobo menciona os telegramas nº 51 e 52 onde Oswaldo Aranha informa sobre a cota de cada país. "O que quiz esclarecer, e renovo agora, foi que a Conferencia não pretendeu repartir cotas de admissão pelos paises representados; que sempre acentuei perante ela, que qualquer que seja a imigração no Brasil, tem que estabelecer-se na proporção de 80% nos campos (...). O compromisso foi de estar o Brasil na capital inglesa e ali deliberar sobre o que concretamente poderia fazer, em harmonia com os ideais humanitarios norte-americanos". [p.13]

25. Helio Lobo pede dispensa da representação do Brasil em Londres, considerando ter pessoas mais aptas para tal tarefa. Menciona que para esta reunião que será no dia 03 de agosto em Londres o governo federal deverá "organizar um rapido programa de ação, determinando, por exemplo, que da quota conjunta da Alemanha e da Austria, se destinassem dois terços á imigração catolica, e um terço, senão menos, á israelita, tudo com antecedentes dos melhores, numa inspeção previa feita de acôordo com o Diretor executivo da comissão, as associações interessadas e um técnico nosso. Para as nossas zonas agricolas se dirigiriam esses imigrantes. Essa parcela israelita nada seria, obscuramente o digo, em comparação que, noutra raça e em circunstancias muito mais graves, tem procurado estabelecer-se em nossa terra". [p.14]

26. Finaliza o Ofício mencionando na página 15 a relação de documentos anexados.

- Carimbo: S. de E. das Relações Exteriores 28/07/1938. Serviço de Comunicações. 28/07/1938. n° 3486.
- Nota manuscrita: "Arquivo. 28-7-1938".